ACIDENTE NA SALA
Movo a perna esquerda de mau jeito
E a cabeça do fêmor atrita com o osso da bacia
Sofro um tranco
E me ouço perguntar
Aconteceu comigo ou com meu osso?
E outra pergunta
Eu sou o meu osso?
Ou eu sou somente a mente que a ele não se junta?
E outra, se o osso não pergunta, quem pergunta?
Alguém que não é osso, nem carne, que em mim me habita
Alguém que nunca ouço
A não ser quando meu corpo um osso com o outro osso
atrita ?
(Ferrera Gullar)
"Há poesias que retratam de forma límpida e singular o Real do corpo. O corpo com vida própria que independe de um pré título, que é surpresa, inesperado, e depois tenta se possível, dar conta do se escapa aos dedos com; nomes, títulos e metáforas".